A Propagação da Verdade (Allan Kardec)

Por vezes a verdade é lenta para propagar-se; mas, desde que começa a despontar, cresce sem cessar e não perece, porque a verdade é eterna, e é eterna porque emana de Deus. Só o erro é perecível, porque vem dos homens. 

O progresso é a lei da Humanidade. Ora, a Humanidade não pode progredir senão à medida que descobre a verdade. Uma vez feita a descoberta, está adquirida e inquebrantável. Que teoria poderia hoje prevalecer contra a lei do movimento dos astros, da formação da Terra e tantas outras? 

A filosofia só é mutável porque é o produto de sistemas criados pelos homens; só terá estabilidade quando tiver adquirido a precisão da verdade matemática. Se, pois, um sistema, uma teoria, uma doutrina qualquer, filosófica, religiosa ou social, marchar para o declínio, é prova certa de que não está com a verdade absoluta. 

Em todas as religiões, sem excetuar o Cristianismo, o elemento divino é imperecível; o elemento humano cai, se não estiver em harmonia com a lei do progresso; mas como o progresso é incessante, resulta que, nas religiões, o elemento humano deve modificar-se, sob pena de perecer; só o elemento divino é invariável. Vede-o na lei mosaica: as tábuas do Sinai estão de pé, tornando-se cada vez mais o código da Humanidade, enquanto o resto já fez seu tempo.

Não podendo a verdade absoluta estabelecer-se senão sobre as ruínas do erro, forçosamente encontra antagonistas entre os que, vivendo do erro, têm interesse em combater a verdade e, por isto mesmo, lhe fazem uma guerra obstinada; mas ela logo conquista as simpatias das massas desinteressadas. Foi assim com a doutrina são-simoniana? Não. 

Como prática ela viveu; sobreviveu como teoria simpática e crença individual no pensamento de alguns de seus antigos adeptos. Mas, o constata o Opinion Nationale, levando diariamente alguns de seus representantes, não está longe o tempo em que todos terão desaparecido; então, ela só viverá na História. Donde se deve concluir que não possuía toda a verdade e não correspondia a todas as aspirações.

Isto quer dizer que todas as seitas e escolas que caem estejam no falso absoluto? Não; ao contrário, em sua maior parte, elas entreviram uma ponta da verdade; mas a soma das verdades que possuía não era bastante grande para sustentar a luta contra o progresso e não se acharam à altura das necessidades da Humanidade. 

Aliás, em geral as seitas são muito exclusivas e, por isto mesmo, estacionárias. Disto resulta que as que puderam marcar uma etapa do progresso em certa época, acabam se distanciando e se extinguem pela força das coisas. Entretanto, sejam quais forem os erros sob os quais sucumbiram, sua passagem não foi inútil: agitaram as ideias, tiraram o homem do entorpecimento, levantaram questões novas que, mais bem elaboradas e libertas do espírito de sistema e de exagero, mais tarde recebem a sua solução. Entre as ideias que semeiam, só as boas frutificam e renascem sob outra forma; o tempo, a experiência e a razão fazem justiça às outras.

O erro de quase todas as doutrinas sociais, apresentadas como a panaceia dos males da Humanidade, é o de apoiar-se exclusivamente nos interesses materiais. Disto resulta que a solidariedade que buscam estabelecer entre os homens é frágil como a vida corporal; os laços de confraternidade, não tendo raízes no coração e na fé no futuro, rompem-se ao menor choque do egoísmo.

O Espiritismo se apresenta em condições completamente diversas. Está com a verdade? Nós o cremos; mas nossas bases são melhores que as dos outros? Os motivos que nos levam a nele crer são muito simples; eles ressaltam, ao mesmo tempo, da causa e dos efeitos. Como causa, tem a seu favor não ser uma concepção humana, produto de um sistema pessoal, o que é capital. 

Não há um só de seus princípios – e quando digo um só não faço nenhuma exceção – que não seja baseado na observação dos fatos. Se um só dos princípios do Espiritismo fosse o resultado de uma opinião individual, este seria o seu lado vulnerável. Mas desde que nada avança que não seja sancionado pela experiência dos fatos, e que os fatos estão nas leis da Natureza, deve ser imutável como essas leis, porque por toda parte e em todos os tempos encontrará sua sanção e sua confirmação e, mais cedo ou mais tarde, é preciso que, diante dos fatos, todas as crenças se inclinem.

Com efeito, ele corresponde a todas as aspirações da alma; satisfaz, ao mesmo tempo, ao espírito, à razão e ao coração; preenche o vazio deixado pela dúvida; dá uma base, uma razão de ser à solidariedade, pela ligação que estabelece entre o presente e o futuro; enfim, assenta em base sólida o princípio de igualdade, de liberdade e de fraternidade. É, assim, o pivô sobre o qual se apoiarão todas as reformas sociais sérias. Ele próprio apoiando-se nos fatos e nas leis da Natureza, sem mistura de teorias humanas, não se arrisca a afastar-se do elemento divino. Assim, oferece o espetáculo, único na história de uma doutrina que, em alguns anos, implantou-se em todos os pontos do globo e cresce sem cessar; que liga todas as crenças religiosas, ao passo que as outras são exclusivas e permanecem fechadas num círculo circunscrito de adeptos.

Tais são, em poucas palavras, as razões sobre as quais se apoia a nossa fé na verdade e na estabilidade do Espiritismo.

Allan Kardec
Revista Espírita: Jornal de Estudos Psicológicos - Ano VII, 1864
(nº 12 – dezembro de 1864)







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